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CANNABIS NA SAÚDE: TRATAMENTO, PREVENÇÃO E CURA POR TRÁS DO TABU


Foto: Divulgação

Pesquisa aponta que 8 a cada 10 brasileiros são a favor do uso da Cannabis para fins medicinais


O uso recreativo da Cannabis e a guerra policial contra o tráfico criam a manta de escuridão que afasta a sociedade das possibilidades medicinais do uso da planta. Apesar de ser conhecida por 'dar onda' e alimentar o tráfico, a cannabis tem auxiliado pacientes a encontrar alívio diante das patologias e, consequentemente, qualidade de vida.


Oito a cada 10 brasileiros são a favor do uso da cannabis para fins medicinais, e 7 a cada 10 aceitariam ser tratados com a planta, segundo aponta a pesquisa Exame/Ideia, realizada em 2021, por telefone, com 1.243 homens e mulheres em todas as regiões do país. Apesar disto, o projeto de lei 399/15, de autoria do deputado federal Fábio Mitidieri (PSD-SE), que trata da liberação do cultivo da planta para fins medicinais, ainda aguarda debate na Câmara dos Deputados.

Pesquisas científicas já reconheceram o resultado positivo do uso medicinal da cannabis em tratamento a diversos sintomas e doenças. Entre as principais, estão crise convulsiva, Mal de Parkinson, de Alzheimer, autismo, dor crônica refratária a tratamento convencional, fibromialgia, enxaqueca, síndrome do intestino irritável, ansiedade, distúrbio do sono e até depressão.


Por outro lado, pacientes que têm histórico pessoal ou familiar de esquizofrenia devem manter distância da planta, pois ela potencializa a doença e é a única, até o momento, com a contraindicação.

Médica especialista em canabidiol, Juliana Moura alerta que no caso da depressão, é necessário mais cautela, devido à tendência do paciente de desenvolver a dependência. Ela explica que, desde a década de 1980, quando pesquisadores conseguiram isolar as moléculas, mais de 400 substâncias já foram identificadas. Entre as isoladas, estão o tetra-hidrocarbinol (THC) e o canabidiol (CBD), este último o mais usado na medicina.


Outra descoberta que ajuda a entender a ação da planta no organismo é a dos receptores para os canabinóides.


"Nosso corpo não produz nada desnecessário. Então, se a gente tem, a gente também produz essas moléculas, mas em quantidade bem pequena. Essa é uma descoberta muito importante que dá embasamento à finalidade medicinal da cannabis", conta a médica, que lembra a existência também dos receptores e produção da nicotina.

Há, no entanto, diferenças entre o uso da cannabis que é fumada e a comercializada em forma de óleo, cuja produção separa as propriedades da planta.


"Existem os óleos que são só CBD, por exemplo. Já para o paciente que tem doença degenerativa, a associação com THC tem resultado melhor. O óleo tem essa vantagem. Mas a planta, quer seja fumada ou em alimentos, não tem essa separação".

Além do maior risco de exposição ao THC, que é a propriedade psicoativa e que pode gerar dependência, a médica pontua que a planta não tem tantos efeitos colaterais.


Apesar das comprovações, Juliana lamenta a falta de estudos e pesquisas no Brasil para desenvolvimento da área. "Falta esse incentivo em nível de pesquisa e conhecimento. O conhecimento sobre o funcionamento de determinada substância dá margem a outras pesquisas e acaba barateando o custo do medicamento".



Uso pessoal x venda


A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou ao Portal A TARDE que a importação para uso pessoal e a autorização para comercialização no Brasil são dois processos diferentes. A importação para uso foi regulamentada pela primeira vez em 2015. Já a autorização para que empresas possam regularizar o produto no país e comercializá-lo foi feita em 2019.


Dados do órgão mostram que o número de autorizações concedidas para importação de produtos à base de cannabis saltou de 850, em 2015, para 40.191 em 2021. Segundo a Agência, ao longo dos anos a aprovação do cadastro dos usuários foi automatizada e a resposta caiu de 35 para 5 dias. Atualmente, a lista de autorizações da Anvisa inclui 14 produtos derivados de cannabis e um medicamento específico, o Mevatyl, indicado no tratamento sintomático da espasticidade moderada a grave relacionada à esclerose múltipla.


Quem integra a lista de pacientes que incluíram a cannabis no tratamento é a administradora aposentada Soraya Ludwig, 61. Ela sofreu dois AVC's há cerca de 15 anos e teve sequelas desde então. Além disto, ela convive com a fibromialgia e a ansiedade. Durante os anos, sempre procurou alternativas para diminuir os problemas de saúde, principalmente diante da redução dos efeitos das medicações que usava e consequente necessidade de aumento das doses.



Em 2020, após ter estudado sobre a planta e recebido respostas positivas de três profissionais de saúde que a acompanham e já obtinham resultados com outros pacientes, ela decidiu fazer a experiência e passou a incluir o óleo à base de cannabis em seu tratamento.


"Vi que teve uma melhora na questão da ansiedade e principalmente do sono. Eu acordava muitas vezes à noite. Era um sono cortado. Acordava 1h30, 2h e ficava sempre cansada. Hoje posso não dormir muito cedo mas, quando deito, não tenho mais aquela insônia. E a ansiedade também melhorou", conta ela, que lembra do medo que teve antes do uso.

"Nunca tive reação nenhuma, de ficar lerda, muito doida, não tem nada disso. No início, até pensei nisso, que ficaria zen. Não tem nada disso. Agora, isso vai de organismo a organismo. Hoje, meu uso é maior. Só o fato de dormir melhor, ficar menos ansiosa, me ajudou muito".

Soraya diz que se arrepende de não ter iniciado o tratamento antes.


"Hoje, se conheço alguém que tem essa doença, ou uma insônia e ansiedade muito grandes, indicaria sem dúvidas. Não é milagre. Ele acalma um pouco a questão da ansiedade, para que essa crise fique mais suportável. Ele ajuda nesse sentido. Se eu tivesse essa ideia há mais tempo, talvez hoje tomasse bem menos analgésico".

Uma das empresas que atuam na facilitação do acesso a produtos como os óleos de CBD que auxiliam pacientes como Soraya é a Verdivita, que presta assessoria aos pacientes, orientando e monitorando todo o rito determinado pela Anvisa, desde o formato técnico da prescrição até a importação dos produtos. A empresa tem atuação em diversos países e, no caso do Brasil, viabiliza o acesso do produto aos pacientes.


O projeto começou em 2019 e, na ocasião, o pai, a mãe e o irmão do CEO e pesquisador em cannabis medicinal, Luiz Chilazi, lutavam contra o câncer ao mesmo tempo. Ele já estudava a planta há quase 20 anos e tentava convencer os médicos a optarem pela alternativa, diante da não evolução dos métodos tradicionais. Após colecionar as recusas, decidiu que seus familiares começariam a ser tratados também com a cannabis.


Foto: Arquivo pessoal

"Minha mãe teve uma evolução maravilhosa. Ela parou de sentir dores e recuperou peso, mas infelizmente faleceu pois não suportou a quimioterapia. Mas, enquanto fez tratamento com a cannabis, a qualidade de vida dela melhorou 200%. Minha mãe tava outra pessoa", relata Luiz.

O pai, que teve tumor de próstata, retirou o órgão e entrou em processo depressivo após o falecimento da esposa. Atualmente, a saúde está reestabelecida e o uso do ansiolítico foi abandonado. O irmão de Luiz mora na França e tem acesso ao produto com mais facilidade. Ele começou a usar e, hoje, segundo Luiz, os exames estão normais.


"A função da cannabis é regular nosso organismo. Os médicos não querem estudar - talvez por interesse da indústria farmacêutica - e os que tratam são discriminados. Fico brincando que nosso sistema não é ibuprofeno, é endocanabinóide. Acho que ele foi pouco estudado, a verdade é essa. Ele é responsável por toda regulação do nosso organismo. As pessoas têm o estereótipo de que quem usa maconha é quem não faz nada da vida. É o contrário, ela regula nosso organismo e nos deixa mais dispostos a fazer as tarefas normais. Agora, claro, nas doses corretas", afirma Luiz.

Atualmente, o uso recreativo e o cultivo da cannabis no Brasil são ilegais. Apenas são permitidas a importação e uso médico mediante prescrição e autorização com até 0,2% de THC. Diferente de países como Canadá, Chile, Uruguai e Espanha, onde a legislação é mais flexível.


"O Brasil é o país que cria dificuldade para vender facilidade. Isso está entranhado em nossa raiz. A Verdivita surgiu disso, de poder passar conhecimento, facilitar o acesso à consulta e ao óleo de qualidade e difundir que a cannabis não é isso que pintam dela. O Brasil está indo na contramão. Por que o Brasil está segurando? Só pode ser por interesse. Quem ganha com isso? Só pode ser a indústria farmacêutica. Na Espanha, por exemplo, tem máquinas onde você escolhe o tipo de CBD, o sabor. Quer dizer que a Espanha e a França têm mais conhecimento que o Brasil a respeito do tema? Não tem. Por que lá funciona desta forma?", reflete Luiz.

Os óleos da empresa representaram um divisor de águas para a vida de Gabriel, de 19 anos, que foi diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista aos 7. O tardio conhecimento da condição é atribuído à desconfiança de outras síndromes, que sempre resultavam negativo. O pai, Ricardo Guerra, lembra que Gabriel enfrentava ainda outros problemas.


"Ele é autista severo e o autismo nunca vem sozinho. Há outras comorbidades, como uma pequena paralisia cerebral, acompanhado de um atraso neuromotor e cognitivo muito severo devido à quantidade de convulsões que ele tinha, em torno de 80 convulsões por dia".

Foto: Arquivo pessoal

Guerra se aprofundou sobre a planta e, quando Gabriel tinha 15 anos, passou a usar o óleo de CBD. Os resultados foram percebidos em 48 horas.


"Comecei a perceber os resultados de forma gradativa, principalmente das convulsões que ele tinha, o quadro convulsivo que era muito severo. Hoje, ele não tem nenhuma convulsão, é zero mesmo. Gabriel tem uma autonomia conquistada após o uso do extrato da cannabis".

Além do fim das crises convulsivas, após usar o extrato de canabidiol Gabriel teve redução das crises de ausência, de autoagressão, irritabilidade, ansiedade e hiperatividade, uma vez que ele também possui Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH).


Guerra conta que Gabriel ainda é totalmente dependente, mas já consegue fazer coisas que antes eram inimagináveis.


"Ele já pega a colher e consegue colocar na boca. Ele sabe ir na cozinha e buscar o prato dele. Pergunto o que ele quer, ele me pega pela mão e mostra. São coisas que ele não tinha, ficava deitado o tempo inteiro olhando para o teto. Hoje, ele não toma nenhum anticonvulsivo. Mesmo com o que ele tomava, ainda tinha crise. Depois do extrato, depois do óleo, fui fazendo o desmame e hoje ele só usa óleo. Somente".

Ricardo pontua que buscar conhecimento sobre o produto é fundamental. Após a experiência com Gabriel, ele aprofundou os estudos e recomenda o uso.


"Eu sempre procuro falar que as pessoas precisam buscar se informar a respeito, para tirar o preconceito que essa planta vem carregando, uma vez que foi feita uma demonização enorme em torno dela".

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