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MARIA DE SÃO PEDRO: HISTÓRIA E TRADIÇÃO DA CULINÁRIA BAIANA

Atualizado: 30 de dez. de 2021



“Maria de São Pedro era uma rainha feita de alegria, bondade e arte. Mestra da maior das artes, a da culinária, preservou e engrandeceu a tradição da inexcedível comida baiana, sua cor, seu perfume, seu sabor divino. Seu antigo restaurante era uma festa em frente à Rampa do Mercado Modelo, que o fogo devorou. Creio que Odorico Tavares, Wilson Lins e eu muito concorremos para que Maria de São Pedro e seu restaurante se fizessem célebres em todo o país. Seus fregueses durante 30 anos, seus amigos de todos os dias, celebramos em prosa e verso sua fama. Inesquecível Maria de São Pedro, rainha do vatapá e do efó, do caruru e do abará, das moquecas e dos xinxins, do dendê e da pimenta, rainha da delicadeza e da cordialidade”.

{Jorge Amado – Bahia de Todos os Santos}


No segundo andar do tradicional mercado da Praça Cairu, erguido em 1971 após um grave incêndio na sua primeira edificação, resiste o primeiro restaurante de comida típica que se tem notícia na cidade de Salvador. O caminho percorrido até lá, onde assumiu um amplo espaço de pé direito alto, varanda com vista privilegiada da Baía de Todos os Santos e sinuosas janelas por onde entra a luz solar, foi marcado entre a quitanda e a feira popular, por onde passou Maria de São Pedro, antes de firmar-se enquanto a rainha da culinária baiana, na década de 40.


Tinha apenas 11 anos quando se mudou de Santo Amaro da Purificação, no recôncavo baiano, para a capital da Cidade da Bahia, em busca de oportunidades. Maria de São Pedro chegou à soterópolis para tomar conta de crianças nas chamadas casas de família. Mais tarde, carregando dois filhos, montou a sua primeira barraca de culinária baiana na Cidade Baixa, na antiga Feira do Sete.


A aptidão para o sabor lhe renderia muitos frutos e longas filas da freguesia, por isso, o negócio não demoraria a mudar de endereço. Em 1925, com a ajuda de um freguês e fornecedor, e devido ao sucesso do seu tempero marcado por dendê, pimenta, camarão seco e leite de coco, a quituteira abriu o seu primeiro restaurante no Mercado Popular, próximo à Feira de Água de Meninos.



Estabelecida no seu mais novo ponto, Maria ganhou fama. Além dos trabalhadores do Comércio, começou a receber visitas dos ilustres boêmios da cidade de São Salvador. Jorge Amado era um desses. O intelectual buscava inspirações para algumas de suas obras, que descreviam cheiros e sabores da culinária típica. Ia sempre acompanhado de amigos e compadres.


Foi em 1940 que Maria de São Pedro fez a sua primeira mudança para o antigo Mercado Modelo, uma estrutura que ficava ao lado do prédio atual, consumida pelo fogo em 1969.


Nesse endereço recebeu os mais célebres convidados. Neruda, Sartre, Caymmi e Carybé figuravam a lista. O seu cardápio, farto de moquecas, frutos do mar e pratos típicos como o bobó de camarão, era um sucesso absoluto. A fama de suas receitas já alcançava grandes distâncias. À convite do conde Matarazzo, viajou para São Paulo para cozinhar o banquete em comemoração dos 400 anos da capital paulista. Ninguém resistia ao sabor das receitas banhadas no óleo de dendê.


Quatro anos depois desse grande evento, não curtiria muito mais o título de dama da culinária baiana que recebeu de seus admiradores.


“Minha avó faleceu aos 57 anos, antes de ver a mudança do restaurante para esse novo Mercado Modelo”, conta Célia, uma das responsáveis pelo estabelecimento nos dias de hoje.

“Infelizmente, não cheguei a conhecê-la, mas alguns primos tiveram essa chance. Teve 14 filhos, mas apenas uma está viva, minha tia Eunice”.


Com a sua partida, Maria de São Pedro deixou sob a responsabilidade dos filhos e netos a preservação do seu legado na cultura da culinária baiana.


Foi seu caçula, Luis Domingos, que encomendou ao artista plástico Carybé o desenho de uma baiana com o tabuleiro na cabeça, marca registrada do restaurante. A representação foi capa do cardápio e levava, além da assinatura do artista, versos de Jorge Amado e Vasconcelos Maia feitos para a matriarca da família, a quem consideravam a maior quituteira da Bahia.


Muito tempo se passou desde a sua partida. De lá pra cá, a impressão do cardápio se modernizou, seu desenho virou uma placa com luzes piscantes que indicam a direção do restaurante no grande salão, os arredores do mercado passaram a ter a dinâmica de uma cidade grande: carros pra todo lado. Diariamente, diversos turistas e soteropolitanos continuam ocupando o espaço com seus sorrisos de admiração, provando receitas que fazem o caminho da cozinha até suas mesas há quase um século de Maria de São Pedro, a menina que veio do recôncavo sem grandes perspectivas, tornou-se a moça altiva que um dia rabiscou Carybé – caminhava em frente com seus quitutes, equilibrados sobre o seu domínio, rumo à estrada que a tornaria uma das grandes referências da história da culinária de sua terra.




FONTE:



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